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sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Belo Horizonte, MG, 31 de outubro de 2009


Por debaixo dessa árvore laranja, espaçosa e a fazer tapetes no chão
Esconde-se mistério algum.
Crianças coloridas,
grama perfumada das chuvas,
um cachorrinho com seus pelos de plumas
e eu.


Aqui nesta praça de nome que não me recordo
Aguardo a passagem das horas como quem espera um bolo, sentado em um banquinho ao lado do forno quente.


Tentei apresentar o Mundo Miúdo aqui perto
e disseram-me que não era possível, houve uma curadoria para o fórum, alguém passando o chapéu daria espaço a outros aqui no teatro, fora da programação.
Isso é um problema? – pensei em silêncio.
Mas engoli, calei e segui.


Tenho-me aqui, agora, a contemplar formigas.


E tão pequenina e breve estou, encolhida neste banco de cimento
Que, como útero, me guardo em mim.


Por debaixo dessa árvore laranja
Há um vento gelado a agitar as folhas que tilintam, faceiras,
E pássaros acima, a gritar para que a noite venha.


E agorinha veio um menino
uns dois anos, loirinho,
a me entregar uma flor pequenina, amarela e doce.
Fora o pai que me agradava com encantos delicados de filho
e fez que meu coração transbordasse em ternura.


Seguiram pela grama, filho e pai, a apontar topo de árvores
E eu fiquei aqui, um pouco mais amarela, pequenina e doce.

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Fui para outro teatro, e também não consegui apresentar.
Aí, para fazer tempo ou ter alguma ideia, me vi a andar pelas ruas que me perco, à procura de algo que nem eu mesma sabia o quê.
Ouvi música, fui ver. Um bar. Ai ai, outra briga remexeu-se dentro de mim. Parei em um canto, olhei, olhei, e sem pensar entrei, a falar com o dono. Pode, não tem problema. Fui arrumar as coisas no canto das cadeiras empilhadas.
Arrumando, já vieram curiosos. O quê é isso? Foto? E logo veio gente assistir, abrindo o recebimento de meu mais novo companheiro: um chapéu vermelho.
Passei entre as mesas, se quiserem conhecer o trabalho.. Alguns foram. E entre vai-e-vens fiquei lá, tranqüila com minha caixinha.
Tempos depois, movimento mais nenhum. Aí arrumei tudo e fui para o bar ao lado, posso? Pode! Arruma, curiosidade latente, fui lá e falei, mesa em mesa. Veio um menino. Três rapazes. E mais, e mais.
No final estava contente com as conquistas, coragem variante e um pouco de dinheiro no bolso. Voltava para casa ou para um lugar que não sabia onde. E me chamaram, desculpe, o quê é isso, estamos curiosos. Dois rapazes e duas moças. Querem ver? Eu monto.
Apresentei. Gostaram. Atrevo-me a dizer que gostaram muito. Contato, nos falamos, fique mais em BH. Não posso, amanhã me vou para meus miúdos. Levou-me em casa, inocência minha em não perceber. Ou não querer notar, ou não querer.



SOBRE PESCARIAS

Se ele soubesse o quê é não acreditaria
O quê me dói, me cerca e arrasa é a sensação sempre presente de ser a caça, jamais caçadora. A que é escolhida, nunca a que escolhe. Nunca o anzol, sempre a presa.
E hoje, mais uma vez, caça fui.
Se ele soubesse que era isso, não insistiria em ficar
Porque é bela a força da paixão, mas há outras vírgulas que preciso tentar, aprender e errar. Outros pontos finais que tenho que dar. Outras exclamações e interrogações a buscar. E, como aprendi com uma grande amiga, muitos carneirinhos de ‘nãos’ a contar.

Cansada estou, caça caça caçadora.
E se não me arrisco a trabalhar isto em mim nesta viagem, não haverá coragem em lugar algum dentro de mim.
Vai, vai embora caçador
E deixe cadeados de mistério e anzóis tortos em minhas mãos perdidas.

Um comentário:

Viliane Turatti disse...

Aêee, contando carneirinhos!! uhu!!

Lembrei de uma conversa antiga, quase perdida, que poderia ser traduzida em:
"Mulheres, caçadoras misteriosas disfarçadas de caças!"
Olhar-flecha, sorriso-rede, eles-carneirinhos, hein?!

Boa descoberta!